terça-feira, 4 de outubro de 2016

Itália - Dia Nacional em Memória das vítimas da imigração

A Itália celebrou nesta segunda-feira, 3 de outubro,  a primeira Jornada Nacional de Memória e Acolhimento. A data recorda 3 de Outubro de 2013, dia em ocorreu o terrível naufrágio de uma barco de migrantes ao largo da pequena ilha de Lampedusa (em frente da ilha da Sicília) e que custou a vida a 366 migrantes, na sua maioria do corno da África, isto é Eritreia, Etiópia, Somália…

Recorde-se, o Papa Francisco tinha-se deslocado a Lampedusa alguns meses antes (sua primeira viagem pontifícia para rezar pelos migrantes e enaltecer o espírito de acolhimento dos lampedusanos e mais tarde recebeu no Vaticano, alguns sobreviventes dessa tragédia.

P. Mimmo Zambito
Desde há três anos pároco de Lampedusa sublinha em entrevista à Rádio Vaticano que os lampedusanos têm a consciência de viver numa ilha remota nos confins entre dois mundos e quando vêem chegar homens, mulheres e crianças, são particularmente sensíveis, pois que sabem o que significa ir e vir desta ilha e compreendem que é certamente por motivos muito graves que essas pessoas fogem das suas terras e passam por Lampedusa à procura de um projecto de vida.

- P. Mimmo, como vivem os lampedusanos estes dias da Memória,

Este dias são terríveis, na memória e na recordação, mas, por mais paradoxal que pareça, são também dias de muita alegria, pois muitas famílias acolheram sobreviventes nos dias sucessivos ao 3 de outubro de 2013. São também jornadas de empenho porque a paróquia promove um encontro, não só da necessária oração, mas também de empenho a fim de que Deus inspira a realização de corredores humanitários aos governos da nossa Europa.
- Corredores humanitários por um lado e, por outro, o muro de Calais: para que pode servir, a seu ver, esse muro?
Tivemos precisamente aqui o bispo de Calais e com absoluta profundidade e simplicidade recordou os valores constitutivos da República, isto é a fraternidade, e como bispo, recordou, obviamente, o valor universal que tem a fé na unidade de todo o género humano. Tivemos essa relação tão particular precisamente para indicar que a Terra pertence a todos e que construir muros ou outras formas de barreira não é uma solução. Isto penaliza a sobrevivência destes nossos amigos, mas também a nossa: isto é a negação do direito do outro arrasta consigo o direito de quem oprime. Na realidade trata-se de homens, de mulheres e de crianças que fogem de situações terríveis.

 - Não basta comover-se, não é?

O Papa Francisco nos ensina que não podemos parar-nos só quando advertimos a espada no coração: é preciso que essa comoção nos leve a uma relação viva, real, tomar consciência da realidade desta tragedia e agir olhos nos olhos, mãos nas mãos, agir a fim de que não só não voltem a acontecer tragédias como esta, mas também a fim de que essas pessoas possam atingir a meta da sua viagem.

- Como vê o papel de Lampedusa nesta indizível crise migratória?

Creio que a função fundamental de Lampedusa é uma espécie de reconciliação à vida, de nascimento à vida, à dignidade, à liberdade, como adultos. O valor de Lampedusa para estes nossos amigos é marcado sobretudo por aquilo que passaram nos países de origem, por aquilo que passaram ao atravessar o deserto, os entes queridos que perderam, as tragédias, as humiliações… E não falemos do que sofrem na Líbia!: são reclusos, oprimidos, violentados, derrubados e mortos…. E depois uma ulterior tragédia, o atravessar o mar naquelas condições em que outros mais perdem a vida ou passam por violações de toda a espécie. Quando chegam a Lampedusa ninguém lhes bate, ninguém os humilha, mas com muita simplicidade alguém lhes sorria e lhes oferece um copo de chá, lhes dá as boas-vindas à Itália, à Europa. É este o valor de Lampedusa. Mas depois esta fileira de dignidade, de liberdade precisa de continuidade noutras etapas…

- Como deve agir a Itália, a Europa para que haja uma solução mais humana à questão das migrações?

Trata-se duma fileira de dignidade que a Europa no papel, e a Itália, obviamente, declara. A Itália está a desempenhar esta função de salvamento e é preciso reconhecer o mérito das acções de salvamento aos Operadores da Guarda Costeira, ao nosso governo a fim de que não pese sobre os italianos a vergonha de ver morrer pessoas devido à nossa falta de acção para os socorrer. Esta fileira de cidadania europeia – que deve ir constituindo-se com a Declaração dos Direitos dos Refugiados e dos Requerentes Asilo – precisa de outras acções que não são desenvolvidas em Lampedusa ou desempenhadas pelos lampedusanos. Nós temos a consciência de fazer parte de uma fileira de dignidade e de caridade, de solidariedade, que se esbate pela Europa e que encontra oposição e negação um pouco por todo o lado.
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O drama dos migrantes que perdem a vida no Mar Mediterrâneo está sempre sob os nossos olhos. A Guarda Costeira italiana faz tudo o que pode para salvar vidas humanas. De 1991 a hoje já salvou mais de 700 mil migrantes. Uma acção corajosa de marinheiras e marinheiros que o Corpo Diplomático Africano em Roma quis homenagear no âmbito do Dia da África, em Maio passado.

Nessa ocasião, uma placa alusiva a esse reconhecimento foi  entregue, num acto solene e comovente,  ao Comandante Geral da Guarda Costeira italiana, Almirante Melone, na presença do Ministro Italiano dos Transportes, Graziano del Rio.  

Em entrevista, nessa ocasião, à Rádio Vaticano, o Embaixador de Cabo Verde, Manuel Amante, que é também Presidente do Comité dos Embaixadores para a Imigração, falara da comoção que o acto suscitou nos presentes, nomeadamente a projecção de um breve filme sobre as acções de salvamento e em que são evocadas também as palavras do Papa Francisco aquando da sua visita a Lampedusa em Julho de 2013. 
(DA)

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